A obesidade na adolescência aumenta o risco de desenvolver doença renal precocemente, ou seja, antes dos 30 anos, de acordo com um estudo publicado no Jama Pediatrics. A insuficiência renal é caracterizada pela diminuição ou perda da função dos rins e, se não for identificada e tratada precocemente, pode complicar e evoluir para a necessidade de diálise (tratamento que realiza a função do órgão) ou até de transplante.
O estudo, que incluiu pesquisadores de Israel e dos Estados Unidos, avaliou dados de 593.660 adolescentes israelenses de 16 a 20 anos, que fizeram avaliações médicas obrigatórias no sistema nacional de saúde por causa do alistamento no serviço militar. Foram excluídos aqueles que já tinham algum problema renal, hipertensão ou que faltavam dados sobre o Índice de Massa Corporal (IMC), que é um cálculo de referência internacional que avalia se a pessoa está dentro do peso ideal em relação à altura.
Os jovens foram acompanhados por cerca de 13,4 anos. Nesse período, 1.963 deles desenvolveram a doença renal precocemente. Os pesquisadores constataram que ter o IMC elevado na adolescência aumenta o risco de insuficiência dos rins, que é maior proporcionalmente ao grau da obesidade.
“É o primeiro estudo que mostrou uma forte relação entre a obesidade em jovens ser um fator de complicação para o desenvolvimento da doença renal precoce. Até então, nós sabíamos que a obesidade na adolescência aumentava o risco de desenvolvimento de diabetes, de hipertensão, de alguns tipos de câncer na vida adulta, mas não tinha nenhum estudo que mostrasse que poderia levar à insuficiência renal, que é a perda da função do rim”, afirmou o endocrinologista Paulo Rosenbaum, do Hospital Israelita Albert Einstein. O médico ressalta que o estudo reforça o quanto a prevenção da obesidade, inclusive na adolescência, é importante para evitar esse tipo de complicação.
O que é a insuficiência renal?
Segundo Rosenbaum, a insuficiência renal acontece quando os rins vão perdendo a sua função, que é a capacidade de filtrar o sangue e eliminar substâncias tóxicas do organismo. Além de não conseguirem trabalhar normalmente, os rins ficam com menor capacidade de controlar a quantidade e a distribuição de água pelo corpo, bem como os níveis de eletrólitos (como sódio e potássio).
Quando a insuficiência renal perdura, ela se torna crônica e é comum que a pessoa desenvolva também hipertensão arterial. Um paciente com a doença nos rins tem mais risco de sofrer um infarto e de ter uma morte prematura. “A insuficiência renal é algo irreversível. Se não agir adequadamente controlando a pressão arterial, o peso, a glicemia, a pessoa pode precisar de diálise e, em casos mais graves, de transplante renal”, disse o especialista.
O endocrinologista explica que é normal, com o avanço da idade, que aconteça uma diminuição da função dos rins, especialmente nos idosos: “mas o que o estudo demonstra é que a obesidade sozinha foi o fator que levou esses adolescentes a desenvolverem uma perda da função renal no início da vida adulta, o que a coloca como fator de risco importante. O que isso significa? Que se eles não forem tratados, provavelmente eles vão desenvolver uma insuficiência renal mais precocemente, independente de questões de glicemia ou pressão arterial alterada”,.
Os pesquisadores apontam ainda que um em cada cinco adolescentes nos Estados Unidos apresenta obesidade e isso leva a uma série de problemas na vida adulta: câncer, infarto, diabetes, hipertensão, síndrome metabólica, mortalidade e dificuldade em fazer com que essas pessoas percam peso.
No Brasil, segundo levantamento de 2022 feito pelo Observatório de Saúde na Infância, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), o excesso de peso (que inclui casos de sobrepeso e obesidade) afeta uma em cada dez crianças e um em cada três adolescentes de 10 a 18 anos. Entre 2019 e 2021, período que engloba a pandemia de Covid-19, o número de adolescentes com excesso de peso no país aumentou 17,2%.
“A prevenção é extremamente importante. Se identificarmos um adolescente com obesidade, isso deve servir como um sinal de alerta de que precisamos fazer alguma coisa para evitar que ele se torne um adulto obeso. Precisamos agir para tentar evitar que essas crianças e adolescentes fiquem acima do peso”, afirma o médico.
Ele explica que, entre as alternativas, estão ter uma alimentação escolar e familiar mais saudável, estímulo para a prática de atividade física e incentivo ao aleitamento materno. “São medidas que podem ser feitas desde a infância para ajudar a evitar a obesidade na vida adulta”, concluiu Rosenbaum.